segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Berço de inovação e empreendedores!

Ary Plonski, da Anprotec: “É preciso ter uma ideia clara do que é inovação, que sempre requer mudança tecnológica, mercadológica e organizacional combinadas”

Em uma entrevista pela CRN BRASIL, Quase no final de uma conversa, o professor Ary Plonski cita a frase do matemático e astrônomo grego Arquimedes: “Dêem-me um alavanca e um ponto de apoio, que moverei o mundo”. A analogia é forte e tem vínculo intrínseco ao cenário de empreendedorismo e inovação no Brasil atual. O bate-papo com o presidente da Anprotec (Associação Nacional das Entidades Promotoras de Empreendimentos Inovadores) estendeu-se por mais de uma hora em uma sala na faculdade de administração e economia da Universidade de São Paulo e percorreu temas que foram muito além de incubadoras e parques tecnológicos, como pode ser conferido a seguir.

CRN Brasil – Como está o cenário de incubadoras e parques tecnológicos no Brasil?

Ary Plonski – Vem evoluindo positivamente por quatro razões, sendo duas de natureza geral e duas de natureza específica. As gerais são a elevada taxa de empreendedorismo no País, sendo que a relação entre os que empreendem por oportunidade e necessidade evolui favoravelmente para o primeiro grupo. O segundo elemento de contexto positivo em termos gerais é o fato de que inovação entrou para a agenda nacional. A ideia contaminou, no sentido positivo da palavra, a sociedade brasileira. Essas são duas questões de fundo.

CRN Brasil – E com relação a questões específicas?


Plonski – Uma é que o próprio resultado dos movimentos anima outras pessoas. Quando você tem bons exemplos, mais gente vai querer fruir essa mesma oportunidade. Os resultados estimulam o avanço. O quarto elemento dessa composição é que o tema do empreendedorismo está cada vez mais presente, por exemplo, no ambiente acadêmico. Antes, isso era uma coisa distante e, agora, há incubadoras e cursos sobre o tema em faculdades.

CRN Brasil – O contexto nos parques tecnológicos segue a mesma lógica?

Plonski – Há outras variáveis específicas e aí elas são bastante diversas e variam de acordo com o tipo de parque. Se pegarmos como exemplo o Rio de Janeiro, uma das variáveis é a atratividade para instalação de centros de P&D de companhias internacionais, IBMs e GEs da vida, pela proximidade de instituições de ensino de excelência, como a (Universidade) Federal do RJ e, também, pela vizinhança com um centro de pesquisa da Petrobrás, que é uma gigantesca plataforma de interesse para quem atua na área de pesquisa. Mas isso é apenas um exemplo para dizer que cada parque em uma localidade terá um conjunto de motivadores específicos.

CRN Brasil – A proliferação dos parques tecnológicas parece um movimento recente por aqui.

Plonski – O modelo não, mas a proliferação deles, sim. Uma estatística do último censo que fizemos (dezembro de 2008) indica 74 iniciativas que se autodenominam parques tecnológicos em operação, implantação ou projeto. Do total, dois terços eram iniciativas de poucos anos antes do estudo.

CRN Brasil – O que desencadeou isso?

Plonski – Em primeiro lugar, o avanço da inovação. Além disso, há um esforço para avaliar a nova competitividade dos territórios. O que tornava as cidades, regiões e estados competitivos historicamente eram recursos naturais e coisas desse do tipo. Agora, é preciso compreender os novos fatores de competitividade. Os resultados dos que investiram antes em parques tecnológicos mostraram resultados muito bons. Mas deixa eu inverter a entrevista e te perguntar: qual a principal fonte de geração econômica e de impostos de Florianópolis?

CRN Brasil – Sem pensar muito e de uma forma bastante superficial eu diria que é o turismo, mas analisando o contexto de nossa conversa, vou arriscar que é software.

Plonski – 100% das pessoas falariam que é o turismo. Mas números da prefeitura a partir de 2007 diziam que a contribuição das empresas de software dentro de Florianópolis, estando no parque tecnológico ou graduadas nas duas incubadoras da cidade, representam o dobro do turismo. Esse é um exemplo da nova competitividade dos territórios. Não que o turismo não seja uma âncora importante, mas que há novos fatores e oportunidades. Você não despreza as fontes tradicionais, mas busca outras formas de alavancar negócios.

CRN Brasil – Nos anos 90 houve uma explosão no número de incubadoras no País.


Plonski – A partir de 1994, com o Plano Real. Até então, com uma inflação incontrolável, o horizonte de tempo era muito curto. Numa sexta-feira, pensava-se o que fazer com o dinheiro até, no máximo, a segunda-feira seguinte. Com certa estabilidade, era possível arriscar compromissos maiores e olhando mais para frente.

CRN Brasil – É impressão ou começam a aparecer algumas incubadoras de cunho privado no Brasil?

Plonski – Tem algumas, não muitas. Recentemente a Telefônica abriu uma incubadora em um projeto que se chama Wayra. Eles tão seguindo essa iniciativa em diversos países.

CRN Brasil – Que vantagem tem uma empresa do porte da Telefônica de lançar uma incubadora?

Plonski – Minha percepção é que eles querem três coisas: criar um ecossistema de negócios inovadores nos quais poderão ter ou não interesse em alguns projetos que serão desenvolvidos lá, ou algo que tenha relação com sua atividade dentro de um ecossistema vibrante no qual eles consigam alguma sinergia. A segunda razão, na minha interpretação, seria uma forma excelente de a empresa estar próxima a jovens talentos e a terceira, acho, é alguma coisa positiva para a imagem da companhia em segmentos importantes. É uma iniciativa nova e aposta.

CRN Brasil – Há uma tendência de incubadoras privadas?

Plonski – São poucos casos ainda. Houve uma tendência em que apareceram algumas aceleradoras de negócio e muitas não deram certo.

CRN Brasil – A Anprotec tem alguma cartilha para empresas que eventualmente queiram seguir o mesmo caminho?

Plonski – Acho que ainda não temos maturidade para fazer uma cartilha, mas creio que o nosso papel é abrir espaço para que esses casos sejam apresentados e divulgados. Esperamos acompanhar essas iniciativas e torcemos para que outras empresas se inspirem, principalmente aquelas que já possuem uma sensibilidade para o tema.

CRN Brasil – O que vem por aí quando o assunto é incubadoras e parques tecnológicos?

Plonski – Há muito pela frente e as coisas mudam. Acho que, no caso de parques, há um movimento que passou por três fases, começando com o pioneirismo de algumas iniciativas que já completam 15 ou 20 anos; há um segundo momento, que foi de proliferação e, agora, o que sugerimos é um período de sistematização, ou seja, embora cada parque seja único, existem questões e desafios comuns. A lógica que trabalhamos é a de parque de terceira geração, que só faz sentido se estiver inserido em uma plataforma ou estratégia de desenvolvimento nessa nova fonte de competitividade.

Em incubadoras, o que trabalhamos muito é um programa chamado CERNE (Centro de Referência para Novos Empreendimentos), que faz com que elas, sistematicamente, se voltem mais para fora. Seu papel não é apenas cuidar das empresas incubadas, mas ser um núcleo de apoio ao empreendedorismo e inovação na sua cidade e microrregião. A tendência é a atuação como núcleo de desenvolvimento regional, no sentido mais elástico do termo e voltado para fora. O programa se inspira bastante em modelo de fora do País.

CRN Brasil – Que inspiração é essa?

Plonski – Na Europa, por exemplo, tem um modelo mais bonito e que nos inspiramos bastante que é o implantado em Barcelona, chamado 22@, que consegue, ao mesmo tempo, estimular empreendedores na região desde temas mais gerais, até questões mais específicas, que é incubar algumas dessas ideias. Até porque, em uma incubadora você vai poder atender um número limitado de empresas. Então, como mudar a escala, se não posso colocar toda hora mil novos empreendimentos no processo? É preciso prestar outro tipo de serviços para a sociedade.

CRN Brasil – Na sua visão, como o Brasil se posiciona no cenário mundial de inovação?

Plonski – A pergunta que sempre se faz é: sabemos que o Brasil é um país criativo. Em geral, não se discute isso; mas, somos um país inovador? A questão tem a ver com o entendimento mais claro do que se tem de inovação, que é um termo muito confundido com outros, como por exemplo, invenção. Uma frase bastante comum é “o Brasil publica tantos artigos científicos etc, mas o número de patentes vai mal. Conclusão: o Brasil não inova”. Como professor, daria nota zero aos que pensam assim. Patente é de invenção e não inovação, que são coisas distintas. É preciso ter uma ideia clara do que é inovação, que sempre requer mudança tecnológica, mercadológica e organizacional combinadas.

A pergunta é: somos um país inovador? Temos algumas condições de inovação presentes, tais como criatividade, inventividade mesmo sem patente, etc. Existem outras condições em que, geralmente, somos um pouco mais limitados, como a capacidade de gerir mudança (tecnológica, mercadológica e organizacional) de forma integrada, que é o que faz a inovação acontecer. Isso significa não só ter um novo conhecimento, mas empacotá-lo, precificá-lo, fazer os registros e vendê-lo. Entender que se trata de um conceito que traz implementação novos produtos, serviços ou processos na sociedade. Em suma, em alguns componentes estamos bem e, em outros, não tão bem assim.

CRN Brasil – O empresariado brasileiro tem conseguido trabalhar onde está mal e potencializar o que faz de bom?

Plonski – Há muitas ações sendo feitas para que isso ocorra. Você ouve críticas de que o empresário brasileiro não é inovador. Pode ser. Mas, para que ele fique mais tempo no mercado, tem que ser um herói por passar pelas maluquices pelas quais o Brasil passou, de enfrentar uma inflação exorbitante e toda a dificuldade de ser um empresário honesto e trabalhar direito. Isso não é uma coisa trivial. Claro que gostaríamos que inovasse mais, mas, vamos trabalhar para criar uma nova geração de empresários que tenha a inovação no DNA. Precisamos capacitar em questões como gestão. Não é necessário mostrar porque inovação é importante. Preciso dar condições para que a ideia se transforme em negócios, isso sim. Nosso papel é um pouco isso, ajudar a criar uma nova geração de empreendedores, para que a meninada saia e, ao invés de pensar em ser funcionário público, crie o próprio negócio. Empregabilidade não é apenas você trabalhar em uma grande companhia, mas criar seu próprio negócio.

CRN Brasil – A pergunta para tirar zero: esse negócio de registro de patente, então, não reflete o quão inovador é o Brasil?

Plonski – São coisas diferentes. Trabalhamos com as empresas incubadas a questão da propriedade intelectual e isso, em certos segmentos, é muito importante, como o farmacêutico, por exemplo. Em outros, não é relevante.

CRN Brasil – Em TI é importante essa questão da patente
?

Plonski – É menos, lembrando que a velocidade de novidades nesse mercado é grande. Peguemos o ciclo de vida de um produto de TI e verá que dura pouco tempo. Há poucos produtos com mais de dez anos. Tem o Windows, mas é difícil lembrar de muitos exemplos. No Brasil, leva-se de 9 a 11 anos para se conseguir uma patente, mas mesmo que fosse possível em três anos, talvez não fosse o tempo hábil necessário. Há uma certa fetichização das patentes, porque é fácil de contar. Não quero dizer que a propriedade intelectual no Brasil é brilhante, mas há um certo exagero. A patente dá uma ideia, mas tá cheio de patentes por aí que não valem nada.

CRN Brasil – Muita gente critica o ambiente empreendedor nacional. Há motivos pra isso?

Plonski – Há uns casos onde o ecossistema traz alguns elementos de inovação dramaticamente mais favoráveis do que no Brasil. Um deles é o cenário de capital de risco (venture capital). E ele é menor aqui ainda por várias razões: não tem mercado de saída, mas há coisas sendo feitas que vão desde a criação de grupos de investidores anjo, para pegar o pessoal do começo até outras ações. A BM&FBovespa entrou como associada à Anprotec, por exemplo, porque procura seus novos clientes. Claro que não é agora que vai mudar, mas, daqui a pouco, talvez tenhamos uma nova Bematech, que foi um negócio que nasceu incubado. Queremos ajudar a criar novas Bematechs, para que elas entrem no mercado. Há um conjunto de fatores subjetivos também. Fazer crítica é um esporte nacional. Em geral – e uma coisa que me incomoda – é que a culpa é sempre do outro. A empresa diz que a universidade não quer nada; a universidade diz que a empresa não se interessa por inovação e os dois dizem que o governo é incompetente. Tem um pouco disso. A questão é – e trabalhamos para isso – para criar exemplos positivos.

CRN Brasil – Há, ainda, aquele velho chavão que diz que se o Bill Gates fosse brasileiro, a Microsoft seria uma empresa de garagem.

Plonski – Vamos partir da premissa de que esse argumento é correto. Como, apesar disso, a Bematech chegou onde está? Vamos olhar esse caso e ver como “apesar disso” esses exemplos podem ocorrer e trabalhar para diminuir as dificuldades, não para encontrar nas adversidades argumentos para não fazer nada.

CRN Brasil – Até que ponto o setor de TI e Telecom está conectado ao ambiente de incubadoras?

Plonski – Ainda, a principal categoria econômica das empresas graduadas é de tecnologia da informação. Há algumas razões para isso. Uma delas é porque TI é um coração de mãe… cabe muita coisa.

CRN Brasil – Deve mudar alguma coisa quando falamos em capital empreendedor (venture, seed e angel capital)?

Plonski – Quem olhar no conjunto verá que os interesses estão nos andares superiores, ou seja, no private equity. Mais abaixo, tem ocorrido iniciativas como a da Finep, estimulando a fazer esse tipo de ações para outros patamares de investimento. Isso vai aumentar. Por exemplo, neste momento, existem apresentações ao BNDES para criar um fundo de apoio a pequenas e médias empresas de tecnologias limpas. Lembrando o velho Arquimedes “me deem uma alavanca e um ponto de apoio, que moverei o mundo”. Não que tenhamos exclusividade nessa questão, mas diria que, para mover o Brasil no campo da inovação, é necessário alavancas, que são recursos, e pontos de apoio, que podem ser essas 420 incubadoras e parques tecnológicos.


Fonte: http://crn.itweb.com.br

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